Hellen Cristina Semeão Garcia

Mestrando

RESUMO: Este artigo se propõe discutir as relações  de trabalhos invisibilizados no Brasil a partir da divisão de eixos que possibilitem dialogar com as tensões existentes no campo da discussão sobre gênero,  raça, poder e classe com base nos entrelaçamentos  e intersecções que ainda colocam a mulher em uma  condição desigual em relação ao homem, e a mulher  preta e transexual em uma condição distinta da mulher branca. Para isso, a mulher será analisada sobre  as diversas diferenças que as permeiam e as colocam  em lugares discrepantes a depender de marcadores  como raça, sexo e classe.

INTRODUÇÃO

A discussão sobre poder é necessária para se compreender as diversas estruturas que se apoiam e se articulam em um movimento de divisão de raça, classe e gênero. Para isso, compreender aspectos históricos  sociais, estruturais e estruturantes é pensar na composição de formação  dessas relações. O trabalho, os movimentos sociais, as lutas identitárias  são pontos centrais para reflexão de processos historicamente excludentes que de certo modo, encontraram no capitalismo uma forma de  colocar determinados grupos em espaços determinados. Alguns grupos  ficam limitados a uma definição para legitimação de sua existência e esse  caráter engendrado em uma perspectiva eurocêntrica, vai buscar definir  a mulher, o negro, o indígena e o transexual e ditar em quais espaços  no mercado de trabalho eles devem e podem ocupar, sob uma ótica focalizada no homem branco, cisgênero, burguês e heterossexual. Nesta  perspectiva, o objetivo deste trabalho, no caso a mulher, aparece como  uma das inúmeras frentes que precisam ser acessadas para se discutir a  questão da desigualdade de gênero neste campo. Para isso, será construída uma linha do tempo para discorrer sobre os aspectos históricos que  contribuíram para construir a mulher brasileira no mercado de trabalho contemporâneo, bem como serão abordadas as diferenças dentro do  universo mulher considerando raça, sexo e classe.

A Revolução Industrial iniciou um marco na história da mulher na sociedade, seu papel foi muito questionado pois neste período  havia tensões entre a classe burguesa e o proletariado, com o objetivo  de produzir, o capital humano foi dando lugar a chagada das máquinas  a vapor nas indústrias, com isso, houve um rompimento da cidade com  o campo, o que ocasionou o aumento da desigualdade, pois conforme a  pesquisadora. Graduada em Licenciatura em História, Rosane Machado de Oliveira, “a classe do proletariado não era mais dona do seu trabalho,  mas sim, tinham que seguir as inovações, e a produção acelerada das máquinas, sem saber o resultado final do produto.” (OLIVEIRA, 2017 p. 2). Neste período a mulher foi intitulada como mão de obra barata, as 

fábricas buscavam mão de obra infantil e feminina para diminuir o custo de seus produtos e assim obter mais lucro. Como apontou o  historiador  marxista britânico Eric Hobsbawm, […] é quase certo que a fabricação do algodão contribuía mais para a acumulação de capital que outras, ao menos porque a rápida mecanização e o uso generalizado de mão-de-obra barata  (de mulheres e adolescentes) permitia uma elevada transferência  dos rendimentos do trabalho para o capital. De 1820 a 1845, o  produto líquido industrial cresceu cerca de 40% (em valor corrente) e sua folha de pagamento em apenas 5%. (HOBSBAWM  2000, p. 65).

Deste modo, a figura feminina adentra esse espaço em condições muito diferentes dos homens, e embora dados estatísticos apontem  que a mulher esteve presente em maior número nas fabricas em países como França, Inglaterra e Brasil1, foram elas as pioneiras em lutas por melhores condições de trabalho. Essas lutas vão aparecer também na Revolução Francesa, pois este momento foi muito importante para  desmistificar o papel da mulher, que até então, era considerada um sujeito frágil no qual só cabia assumir as tarefas da casa e cuidar dos filhos.  Jean-Jacques Rousseau, filósofo bastante conhecido na época, vai falar do lugar da mulher, para ele, a mulher não deveria acessar os espaços públicos, muito menos participar ativamente da política ele acrescenta que  “toda mulher em público que se mostra, se desonra” escreveu à D’Alembert” (PERROT, 2009, p.136). Nesta perspectiva, houve um atraso considerável no que diz respeito a participação social e política da mulher, inclusive a educação da mulher francesa seguia um modelo ortodoxo 

1 As mulheres operárias estrangeiras, de acordo com o censo de 1890, eram 119.581  e representavam 34% do total de operários, e estavam empregadas em sua maioria  na indústria têxtil, isto é, trabalhavam com fiação e tecelagem. Em 1894 a participação de mão de obra feminina na indústria têxtil na cidade de São Paulo representava 67,62% do total de operários, e no levantamento do ano de 1901 totalizavam  49,95%, sem contar as crianças operárias do sexo feminino. A participação feminina na indústria têxtil continuou a crescer após a Primeira Guerra Mundial. No ano de 1920, foi recenseado um total de 247 indústrias que trabalhavam com gêneros têxteis, 34.825 operários [14.352 (41,21%) eram homens e 17.747 (50,96%) eram mulheres] (RAGO, 1997).

De preparação para o casamento e vida religiosa, segundo a especialista em Educação e Contemporaneidade, Joessane de Freitas Schmidt “a educação religiosa tinha o objetivo de preparar para a função religiosa ou preparar as meninas para o casamento, cujo destino seria cuidar do marido, responsabilizasse pela administração da casa e educação dos filhos.” (SCHMIDT, 2012, p.2).

Uma outra perspectiva que coaduna com processos excludentes na formação do Brasil no que tange o lugar da mulher na sociedade, é o  período escravocrata, que de alguma forma o capitalismo bebeu e ainda bebê dessa condição análoga, afinal, para que um possa ter ascensão, outro precisa estar em condição inferior. Nesta linha, o sociólogo peruano 

Aníbal Quijano, argumenta que para combater o capitalismo é necessário um engajamento na luta contra a colonialidade do poder, que é um dos principais conceitos-chave de seu pensamento, implicando, entre outras frentes, no combate ao racismo. Para ele, A colonialidade é um dos elementos constitutivos e específicos do padrão mundial do poder capitalista. Sustenta-se na imposição 

de uma classificação racial/étnica da população do mundo como pedra angular do referido padrão de poder e opera em cada um dos planos, meios e dimensões, materiais e subjectivos, da existência social quotidiana e da escala societal. Origina-se e mundializa-se a partir da América (QUIJANO, 2009, p. 73).

Para tanto, adentrando em aspectos teóricos e epistemológicos, Quijano investe numa crítica radical ao que ele caracteriza como eurocentrismo, que seria uma perspectiva cognitiva própria do pensamento moderno que orienta não só o liberalismo, mas também linhas de pensamentos politicamente anticapitalistas como o materialismo histórico, e que implicaria numa compreensão distorcida e reducionista da  realidade social.

Ângela Davis em “Mulheres Raça e Classe”, vai falar das mulheres pretas que na condição analítica de se pensar gênero no espaço de trabalho, fica destinado a elas um lugar extremamente subalternizado, ela afirma que escrava era considerada uma trabalhadora doméstica – cozinheira, arrumadeira ou mãe de leite na “casa-grande”. E neste sentido,

Joan W. Scott no texto “O enigma da igualdade” ao abordar questões relacionadas ao conceito de igualdade e diferença, alude pontos retratados na história onde o determinismo cultural é marcado pelo poder, e ressalta que Na época da Revolução Francesa, a igualdade foi anunciada como um princípio geral, uma promessa de que todos os indivíduos seriam considerados os mesmos para os propósitos de participação política e representação legal. Mas a cidadania foi conferida inicialmente somente para aqueles que possuíam uma certa quantia de propriedade; foi negada para aqueles muito pobres ou muito dependentes para exercerem o pensamento autônomo que era requerido dos cidadãos. A cidadania também foi negada (até 1794) aos escravos, porque eles eram propriedade de outros, e para as mulheres porque seus deveres domésticos e de cuidados com as crianças eram vistos como impedimentos à participação política. 

“Desde quando é permitido abrir mão de seu sexo?”, trovejava o jacobino Pierre-Gaspard Chaumette, ao confrontar-se com mulheres que exigiam participar em clubes políticos. (SCOTT, 2005, p. 15)

Neste sentido, como aponta Davis, a mulher negra ainda estava em uma condição muito pior do que a mulher branca, pois ela é atravessada por dois marcadores de opressão, ser mulher e negra. Para se pensar a mulher na contemporaneidade, não se pode ignorar esses marcos históricos que foram estruturados em cima de desigualdades sociais que reverberam até hoje. Claro que muitas lutas foram primordiais para o alcance de marcos legais, incluído a consolidação da Constituição de 1988 que teve uma grande participação de movimentos sociais feministas e do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), contudo, não se  pode deixar de analisar que mulheres negras, lésbicas e transexuais, não foram consideradas com suas especificidades e que para elas, a ascensão no mercado de trabalho, é algo muito belicoso e muitas vezes demorado. Tomo a obra “A cor das Empregadas” da socióloga Tamis Porfírio que possui o marcador raça como significativo campo de análise, segundo a autora “a natureza do trabalho doméstico delegado a mulheres negras e/ou pobres no Brasil passa a ser construído partir da escravidão,

sendo este trabalho estigmatizado, assim como quem originalmente a exercia, ou seja, a mulher negra” (PORTÍFIO, 2021 p.31).

A socióloga ainda vai questionar em um dos capítulos intitulado “Emprego doméstico: opção ou imposição?” sobre a condição que esta mulher adentra esse  trabalho, esse questionamento traz uma realidade inteligível, e para ela: O mais alarmante no que se refere ao compartilhamento de uma mesma característica é o motivo da entrada no emprego doméstico: a carência de recursos naturais, a necessidade de sobrevivência, a busca pela independência financeira e principalmente, a possibilidade de obtenção de renda, praticando um serviço “naturalmente feminino, que supostamente toda mulher está apta a desempenhar. (PORFÍIO, 2021 p. 84).

Nesta perspectiva, essas características estão atreladas a outros tipos de opressão e desigualdades que se interseccionam e se entrelaçam, como por exemplo, a falta de acesso à educação, saúde, violência e fome. Um outro seguimento que a filósofa Helena Hirata vai apontar em uma de suas pesquisas, é o trabalho de cuidado, que segundo ela, é exemplar das desigualdades imbricadas de gênero, classe e raça, pois os  cuidadores são majoritariamente mulheres, pobres, negras, muitas vezes  imigrantes. (2016, p.54). 

Segundo as pesquisadoras Maria Betânia Ávila e Veronica Ferreira ambas veiculadas ao SOS Corpo – Instituto Feminista para Democracia, o trabalho doméstico tem um marcador de raça muito relevante de ser analisado, sendo este seguimento constituído especialmente de mulheres negras. (2008, p.2). As marisqueiras que realizam atividade de mariscagem, mulheres extrativistas e mulheres que

2- O termo interseccionalidade vem sendo utilizado desde 1989, por Kimberlé Crenshaw, pesquisadora e ativista norte-americana nas áreas dos direitos civis, da teoria legal afro-americana e do feminismo. Carla Akotirene, em seu livro, aponta que para Kimberlé Crenshaw, “a interseccionalidade permite-nos enxergar a colisão das estruturas, a interação simultânea das avenidas identitárias, além do fracasso do feminismo em contemplar mulheres negras, já que reproduz o racismo. (AKOTIRENE, 2019 p.14).

3- Entende-se por marisqueiras, as mulheres que trabalham na mariscagem, ou seja,  que extraem crustáceos e moluscos nas regiões de mangue, áreas estas, situadas na  transição entre o ambiente marinho e o terrestre (VASCONCELOS et al., 2012

sobrevivem das atividades no campo, também possuem uma concentração de mulheres negras nesta função, uma raiz escravocrata marcada pela pele. Contudo, é importante perceber que além da raça, o marcador classe aqui também deve ser analisado como categoria de análise. Essas funções de historicamente desconsideradas, possuem um fator de desigualdade social proeminente, como aponta Alfredo Guilherme Galliano (1981), escritor da obra Introdução à sociologia, a desigualdade social possui relações de interdependência com outras instituições da sociedade, como o Estado, a família e a economia.

Bell Hooks, em 1984 ao publicar Feminist Theory: From Margin to Center “da margem ao centro”, vai falar sobre as questões postas por teorias feministas formadas a partir de experiências de mulheres brancas, cujo a condição social e de poder, não incluíam mulheres negras situadas à margem. Desta forma a autora defende a necessidade de uma teoria voltada as massas, ou seja, “uma teoria que analisasse a cultura de um ponto de vista feminista, enraizado numa compreensão de gênero, da raça e da classe”. (HOOKS, 1952, p. 10). Deste modo, pensar nessas desigualdades sem considerar especificidades culturais e de classe que diferenciam a mulher branca da mulher preta, não serão funcionais do ponto de vista de criação  de ações afirmativas e do fortalecimento da mulher.

Quijano acrescenta que na história anterior ao capitalismo certos atributos nas relações de poder como sexo, idade e força de trabalho tiveram papel central na classificação social a partir da distribuição de poder, fenótipo e força de trabalho, segundo ele, não tinha relação com biologia ou “natureza”, mas com o resultado das disputas pelo controle  dos meios sociais. 

A categoria “raça” é, então, produzida a partir do fenótipo, no contexto de conquista da América e do estabelecimento do padrão de poder capitalista, como um discurso naturalizador de uma diferença não natural. Para ele, Enquanto a produção social da categoria ‘género’ a partir do sexo é, sem dúvida, a mais antiga na história social, a produção da categoria ‘raça’ a partir do fenótipo é relativamente recente e a sua plena incorporação na classificação dos indivíduos nas  relações de poder tem apenas 500 anos, começa com a América e a mundialização do padrão de poder capitalista (QUIJANO, 2009, p. 106).

Desse modo, a modernidade/colonialidade estabelece uma classificação da população mundial em identidades “raciais” a partir das diferenças fenotípicas entre vencedores e vencidos, sendo a cor da pele a marca diferencial mais significativa, divididas entre superiores (europeus) e  inferiores (não-europeus). Sendo assim, a racialização não é um elemento à parte da modernidade e do capitalismo, pelo contrário, está intimamente  ligada a esse contexto histórico e padrão de poder com dimensão global,  orientando e organizando as diversas áreas da existência social:

A ‘racialização’ das relações de poder entre as novas identidades  sociais e geoculturais foi o sustento e a referência legitimadora fundamental do carácter eurocentrado do padrão de poder, material e intersubjectivo. Ou seja, da sua colonialidade. Converteuse, assim, no mais específico dos elementos do padrão mundial  do poder capitalista eurocentrado e colonial/moderno e atravessou -invadindo – cada uma das áreas da existência social do padrão de poder mundial, eurocentrado, colonial/moderno (QUIJANO, 2009, p. 107). 

De certo, o padrão eurocentrado contribuiu e ainda contribui para a divisão de categorias e oportunidades no mercado de trabalho, onde principalmente mulheres negras e transexuais ainda sofrem para conquistar seus direitos e legitimidade nesses espaços. Embora a Constituição Federal de 1988 garanta os diretos básicos para homens e mulheres, no tocante ao capítulo 1 – Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, não existe uma menção específica que fale de direitos para mulheres brancas, negras e transexuais considerando as diferenças latentes que as permeiam. Nesta lógica, importante ressaltar que para as mulheres transexuais, conforme aponta VIDAL4 e PAIXÃO5

 (2016):

4 Graduanda em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Integrante da Clínica de Direitos Humanos da Universidade Federal de Minas Gerais (CdH/UFMG).

5 Graduanda em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Ex-integrante do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da Universidade Federal des vulnerabilidades vivenciadas pela população de travestis e transexuais existem sob diversas facetas: seja pela falta de acesso  às políticas públicas de saúde, educação e qualificação profissional – e, consequentemente, a exclusão dessas pessoas do mercado  de trabalho, seja pela negação histórica de direitos sociais básicos ou aos mais diversos tipos de violências – físicas e psicológicas – às quais esses corpos estão (sub)julgados. Violências que podem, ainda, ser praticadas e reiteradas por familiares, amigos, transeuntes, agentes do estado e pelas próprias instituições.

Ou seja, é urgente discutir formas de inclusão dessas mulheres no mercado de trabalho,pois a elas é destinado um lugar, conforme  aponta Vidal e Paixão, que coloca a prostituição como uma realidade, segundo dados divulgados pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), estima-se que 90% das travestis e transexuais exercem o trabalho sexual no Brasil.“Além disso, “a prostituição é a única esfera da sociedade brasileira onde as travestis podem ser admiradas e  reconhecidas, é nas ruas que elas podem desenvolver sua autoestima.” 

(VIDAL, J. S.; PAIXÃO, O. V. B, 2016, p 164). Esse dado, aponta para necessidade de se pensar em políticas públicas e ações afirmativas que incluam esses grupos socialmente descriminalizados na sociedade. Uma questão interessante, é que a questão da violência nesses tipos de profissões, está muito ligada a questão de dominação e de poder, muitas vezes ligada a figura masculina, seja no papel de explorar do corpo feminino, do pescador ou do patrão, neste sentido como romper como a violência estrutural e com o patriarcado masculino também estrutural? Este artigo não se propõe discutir as formas descontinuadas 

desses tipos de opressões e violência, mas se coloca assim como Pierre Bourdieu sensível a esse campo, é importante dar luz a essa questão visando ganhar mais debate político e público. A questão de gênero precisa ser tratada não apenas pelas questões femininas, mas também masculi

 

Minas Gerais (NUH/UFMG) e do Núcleo de Atendimento a Vítimas de Crimes 

Violentos (NAVCV/MG).

 

6 VIDAL, J. S.; PAIXÃO, O. V. B – Travestilidade, Prostituição e Encarceramento:  Negação de Direitos e “Gestão de Ilegalismos”. Revista do CAAP | n. 02 | V. XXII | pp. 162-176 | 2016. Minas Gerais.

nas, para que desde a educação os meninos recebam educação sobre gênero e consigam ser agentes de mudanças sociais, só assim será possível  romper com a dominação masculina ainda muito forte. Na trajetória da mulher no que concerne os aspectos históricos, segundo a historiadora Margareth Rago, trabalhadoras pobres eram  consideradas profundamente ignorantes, irresponsáveis e incapazes, tidas como mais irracionais que as mulheres das camadas médias e altas,  além de serem julgadas menos racionais que os homens (PRIORE (Org.), PINSKY (Coord. Textos, 2018, p 589). Ou seja, a questão de gênero de raça e de classe, se interseccionaram e foram construindo o formulando o papel da mulher na sociedade por meio da desigualdade social, entretanto, lutas e resistências marcaram a trajetória feminina no Brasil e no  mundo. Desde o início do século XX, que as mulheres no Brasil denunciaram as condições insalubres das fábricas, e as investidas sexuais dos patrões, em grandes capitais como Rio de Janeiro e São Paulo, contudo, existem muitas lutas a serem travadas para que a mulher consiga ser valorizada e reconhecida no mercado de trabalho. Contudo, este tema precisa ser ampliado e debatido para que não somente mulheres, mas que mulheres negras, pobres, indígenas, transexuais possam ter seus direitos assegurados, e passem de vítimas de um sistema opressor para sujeitos de mudança. As oportunidades de trabalho não podem ser definidas por raça, sexo, classe, é preciso que essas lutas se unifiquem e que o Estado compreenda a necessidade de políticas públicas inclusivas que atendam a totalidade considerando suas diferenças.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O campo dos estudos sobre gênero vem ganhando cada vez mais destaque, e é urgente discutir questões que possam garantir os direitos estabelecidos na Constituição Federal de 1988 para mulheres, independente da categoria que ela representa. Não se pode pensar em direitos humanos sem pensar na diversidade que permeia a multiplicidade de sujeitos em um país como o Brasil, onde as oportunidades não estão abertas para todas, todos e todes. O mercado de trabalho é um grande marcador social que coloca uns em condições superiores a outros, e atacar este sistema promovendo educação, saúde básica e políticas públicas  inclusivas, é um caminho importante para romper esse processo estruturante da sociedade.

Embora o capitalismo tenha tido uma forte contribuição para separação de raça, classe e gênero, na análise sobre o capitalismo, de acordo com a perspectiva decolonial proposta por Quijano, se faz necessário não fechar os olhos para o racismo e a classificação social racializada, a produção social de gênero e o padrão de poder que o  articula e normatiza, os atravessamentos entre raça, gênero e a divisão social e internacional do trabalho. É preciso compreender a importância da luta do feminismo, do racismo e dos movimentos identitários  como modelo de luta e resistência a todas as formas de opressão. E enquanto as lutas não forem mais inclusivas, e não tiverem como objetivo romper com todas as formas de opressão, as mulheres, os negros, os LGBTQI+, os imigrantes, nenhum grupo terá sucesso em suas lutas e conquistas. As políticas identitárias não devem ser enxergadas de forma individual e reduzida, essas intersecções precisam ser pensadas e articuladas de forma integrativa. Barbara Smith, feminista lésbica e socialista refletiu de forma muito pontual sobre essa questão, quando disse que as políticas identitárias precisam ser construídas de forma abarcar todas as identidades existentes, sejam mulheres, negras ou negros,  gays e lésbicas, trabalhadores e trabalhadoras, todas essas categorias  precisam ser incorporadas e compreendidas como bases estruturantes e que não são desvinculadas umas das outras.

 

7 Linguagem neutra que referência o gênero não binário

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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Pólen, 2019. 152p. (Feminismos Plurais / coordenação de Djamila Ribeiro)

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DEL PRIORE, Mary, PINSKY, Carla Bassanezi. História das Mulheres no Brasil. 10. Ed, 6ª impressão. São Paulo: Contexto 2018.

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PERROT, Michelle. História da vida privada 4: Da Revolução Francesa à Primeira Guerra. Tradução Denise Bottman e Bernardo Joffily. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

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SCOTT, Joan W. Uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, p. 71 a 99 jul/dez 1995.

VIDAL, J. S.; PAIXÃO, O. V. B – Travestilidade, Prostituição e Encarceramento:  Negação de Direitos e “Gestão de Ilegalismos”. Revista do CAAP | n. 02 | V. XXII | pp. 162-176 | 2016. Minas Gerais.

LEITURAS COMPLEMENTARES

KILOMBA, Grada, 1968 – Memorias da plantação – Episódios de racismo cotidiano/ Grada Kilomba; tradução Jess Oliveira -1 ed. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.